Dá que Pensar - O Valor do Tempo e a Falta de Carácter
Olá a Todos!
Hoje trago-vos um post pertinente, um Dá que Pensar. Desta vez sobre o tempo e o carácter.
Como sabem sou finalista do curso de Medicina e na minha posição de observadora, vejo as injustiças, a indiferença e a falta de humanismo e respeito de algumas pessoas face a outras.
E não, não são só os médicos os maus da fita...às vezes também são os próprios doentes, os familiares, os enfermeiros e os auxiliares.
Vamos começar por mim. Um dia destes tive avaliação de Cuidados Intensivos. Um médico disse-me para estar na sala de reuniões às 12h outro as 11h30 ...e o chefe de serviço as 10h45 disse-me para ir esperar porque ia começar logo...a verdade é que ao escrever este post... ja estava há 1h45 sentada a espera, quando deveria estar noutro estágio a ver doentes e a escrever diários clínicos. E a sensação é péssima.
Esperar por alguém é horrível, ver o tempo a passar, a paciência a esgotar e as coisas que deveríamos estar a fazer e não estamos porque alguém achou que o nosso tempo não tem valor. E enquanto esperava, os médicos passavam e nada me diziam. Ignoram-me e conversam. Bebem café. Riem e falam de outros temas. Se pergunto algo dizem que não sabem e continuam a falar como se nada fosse. É uma vergonha.
É uma vergonha para os doentes. Que chegam às consultas um pouco antes da hora para não se atrasarem e porque nos respeitam, isto depois de terem apanhado um sem fim de autocarros, terem andado a pé e acordado de madrugada...tudo para estarem ca no dia X à hora Y que o médico marcou sem qualquer interesse na sua disponibilidade, e pela qual estão ansiosamente à espera há meses. O grande evento de ir ao médico. Outra vergonha. O doente chega cheio de espectactivas e coisas para contar e para o médico é só mais um. Só mais um estorvo para a hora de almoço. Que esperem. E tratam-se de documentos, reuniões, assuntos pessoais, telefona-se, bebe-se café, passeia-se, conversa-se...enquanto o doente espera. 1h, 2h 3h. Que importa? Se não querem, que vão embora, é da maneira que se almoça mais cedo.
É a impessoalidade do atendimento, desde o momento da chamada, nem sequer merecem a dignidade de serem pessoalmente chamados e cumprimentados pq o médico está muito ocupado para se levantar da cadeira e ir ao corredor. Depois é um sem fim de pois, hm hm's e é a vida's, enquanto se escreve no computador e mal se olha no doente. Então adeus e até para o ano! E venha o proximo. É um desconsolo.
Na urgência faz-se o mesmo. Pessoas com dores excruciantes são totalmente ignoradas, são tratadas/curadas mas sem um pingo de cuidado, de atenção, e se se queixarem ainda levam com um "ai tenha paciência, já se sabe que custa", "se não quer ser tratado então va-se embora que eu tenho mais que fazer e mais pessoas à espera", "nem pense em se mexer e me estragar a sutura". Mas que tipo de gente é esta? É assim que estes Médicos queriam ser atendidos, e que os seus entes queridos o fossem também?
Não somos números. Não somos "secas" nem "mais uns", nem "o da cama x", nem "o que está para morrer". É muito triste.
E os enfermeiros? Que se passeiam pelos corredores altivamente a dar ordens aos funcionários, e a desrespeitar os alunos e os estagiários, porque ansiavam estar no seu lugar e rancorosamente desejam o seu insucesso?
E os auxiliares? Que ignoram os doentes e perguntam desdenhosamente quem somos e o que pensamos que estamos a fazer neste ou naquele sítio? Porque acham que somos apenas doentes, e só com os doentes e familiares é que podem dar ordens e ser superiores. E se lhes respondemos que somos alunos de medicina ou médicos, encolhem-se de vergonha e começam um teatro de bajulação e pedidos de perdão e enchem-se de simpatia angelical. Isto é nojento.
Eu não sou a Dra. Inês do topo da hierarquia hospitalar. Eu sou a Inês e mereço respeito seja qual for o meu papel na sociedade.
Lembram-se do Yuri? O presidiário? Como criminoso que é, foi recebido com revirares de olhos, com "la vem este", "porque é que estes não se matam para lá e nos vêm fazer perder tempo e ainda passam à frente doa outros doentes?", "meu Deus, e tem aqui crianças".
No meu curso aprendi que temos, acima de tudo, que ser humanos. E muitas vezes não é isso que eu vejo. Espero que a minha geração de médicos seja diferente, uma geração com carácter, que respeite, que se ponha no lugar do outro, que escute e observe, que cuide.
Peço desde já desculpa aos excelentes médicos, enfermeiros e auxiliares que temos no nosso país. E esta publicação baseia-se apenas, nos poucos (e ainda bem) péssimos profissionais que podemos ter o azar de encontrar na nossa vida.
E acabado este post, eis que o médico me foi chamar para a avaliação, depois de 2h20 de espera. Ao menos...que corra bem...pensei!
Beijinho,
Inês
Ps. Desculpem o aspecto do Post, mas escrevi este texto como um rascunho no email e copiei-o para o blog e ficou assim desformatado :/
Mas não se deixem intimidar hehe, o conteúdo é o que realmente importa neste caso (como em tantos outros!).
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